A Associação Brasileira de Estudos e Prevenção do Suicídio (ABEPS) inicia a publicação de uma série de entrevistas mensais com seus associados. Ao compartilhar trajetórias, experiências profissionais e projetos desenvolvidos em diversas regiões do país, a ABEPS busca fortalecer vínculos internos e reconhecer o papel de cada associado na promoção do cuidado, da pesquisa e da prevenção do suicídio.
Nesta edição de estreia, apresentamos a história de Regina Reis (@reginalreis), mãe enlutada e psicóloga. Regina tem 60 anos e é natural de Valença do Piauí (PI), mas, ainda criança, foi morar com a família em Teresina (PI), onde reside até hoje. Ela conta que casou jovem e que a prioridade inicial foi ser mãe. Foi então que nasceram Alielson, Márcia Laise e Aluisío.
Antes de ser psicóloga e especialista em suicidologia, trabalhou por muitos anos na área da educação infantil. Com a exigência de formação em Pedagogia, ela decidiu cursar a graduação. Seu filho Alielson foi vítima de suicídio pouco depois de ela ser aprovada no vestibular para Pedagogia na UESPI. “Foi muito difícil. No início, ninguém na universidade sabia da minha dor. Eu não conseguia nem falar.”
Foi no voluntariado e no contato com outras mães que Regina encontrou apoio para se fortalecer e se engajar em projetos como o CVV, a criação de um grupo de pais enlutados – o Vida Que Segue – e a participação na Associação Brasileira de Estudos e Prevenção do Suicídio (ABEPS).
Com energia e entusiasmo, além do trabalho como psicóloga clínica, ela continua atuante em diversos projetos, associações e congressos, sempre com o objetivo de transformar a dor em ação. Confira abaixo a entrevista:
Que experiência fez você voltar o olhar para a prevenção do suicídio?
Regina: Meu filho Alielson partiu há 19 anos, no dia 21 de março de 2006. É impossível descrever o sentimento quando acontece uma coisa assim na vida da gente. Na família já haviam acontecido casos de suicídio, mas era uma coisa mais distante, que não despertou em mim a procura por conhecimento. Mas, quando foi com o meu filho, eu fiquei tentando entender: como é isso? por quê? São muitas as perguntas, e comecei a ter interesse em buscar respostas e, na verdade, a gente não encontra essas respostas, pois o suicídio é um fenômeno complexo, multifatorial e não tem uma resposta.
Na época, onde você encontrou apoio?
Para mim foi muito difícil. Inicialmente, eu tive o apoio da minha família. Eu cursava Psicologia e foi durante o curso, ao ser entrevistada para uma pesquisa, que conheci outras mães enlutadas. Éramos sete mães que compartilhavam a mesma dor e, a partir disso, nasceu a ideia de formar um grupo de pais enlutados por suicídio. Esse grupo deu origem ao Vida que Segue, que, em setembro, completa oito anos.
Como é o trabalho do Vida que Segue?
Nós acolhemos pais e mães enlutados de 17 estados do país e uma mãe brasileira que mora em Portugal. Hoje, somos 100 famílias que se acolhem e compartilham a dor, a saudade, a tristeza. A gente realiza encontros mensais, além de visitas presenciais a famílias enlutadas. Um grupo de apoio para um enlutado faz toda a diferença, porque é um compartilhamento com o qual a pessoa se identifica. Ali é um espaço seguro, de fala, de acolhimento, livre de críticas e de julgamentos.
Como você conheceu a Associação Brasileira de Estudos e Prevenção do Suicídio?
Eu conheci a ABEPS quando ainda estava no curso de Psicologia. Eu disse: “Nossa, tem essa associação de pesquisa, de estudo, de prevenção do suicídio. Eu preciso participar, eu quero fazer parte disso, para poder ampliar o conhecimento e saber como é isso a nível de Brasil.” Quando conheci, de imediato, já me associei. E estou na ABEPS até hoje e quero permanecer.
A ABEPS completa 10 anos de existência em junho. Como você avalia essa trajetória?
A ABEPS tem se mostrado muito empenhada em realizar um trabalho para despertar o lado humano nos profissionais. Fico feliz com tudo o que já tem acontecido. Muitos outros profissionais que tenham afinidade com a causa precisam conhecer a ABEPS e fazer parte dela, para a gente somar conhecimento e fazer essa troca de experiências. O Congresso da ABEPS é maravilhoso. A gente conhece outras pessoas e fica com mais vontade de beber dessa fonte. É necessário o trabalho da ABEPS e de outros grupos para a gente se qualificar cada vez mais, trocar experiências e, principalmente, ideias para políticas públicas voltadas à prevenção do suicídio.
Qual a sua mensagem para as mães enlutadas?
Ser mãe já é um desafio. Mãe enlutada, então, é uma coisa assim que não dá nem para descrever. Você não precisa passar por tudo isso sozinha. Tem pessoas que podem ajudar. Muitas vezes o luto deixa a pessoa presa, com vergonha, com medo, por conta do tabu. Eu sei que é difícil, mas se estiver doendo muito, se tiver com aquela necessidade de chorar, se acolha, chore, mas também busque ajuda, porque sozinha é muito difícil.
E o que fica, de fato, é que a pessoa que partiu não se resume ao último ato. Precisa ficar forte a lembrança, o que foi vivido. É isso que a gente precisa lembrar da pessoa: não pelo último ato dela, mas pela história de vida dela, as memórias afetivas, as gargalhadas, as coisas que fizeram. Isso torna tudo mais leve, mais suave.
Conheça o Vida que Segue:
Site: https://vidaquesegue.org.br
Instagram: @vidaqueseguethe